Na discussão sobre a qual fiz alusão em um post anterior surgiu uma bela ferramenta para quem ainda está tendo problemas em compreender o caso possessivo-adjetivo na forma de uma dica do Thorsten Renk:
Tente traduzir o possessivo como “associado com” — então lambe Eldaiva é “a língua associada com os elfos”, Taurë Huinéva é “a floresta associada com as trevas”, Nurtalë Valinóreva é “o ocultamento associado a Valinor” e laman Ranaewendeva é “o animal associado com Ranaewen”…
Você pode ver mais sobre o caso possessivo-adjetivo no Curso de Quenya e uma breve passagem no meu resumo.
Eu já vi muita coisa estranha em fóruns sobre línguas élficas, mas a Elfling merece uma menção honrosa. Segundo Annaka Schultz, o reino Noldor é o melhor exemplo de um povo que aderiu de corpo e alma à causa da Sociedade Protetora dos Animais, pois eles não consideravam qualquer ser vivo como “posse”.
Seria algo maravilhoso, se Annaka tivesse ao menos uma prova textual. Infelizmente, ela não tem. Oops!
Tudo começou com uma tradução para uma coleira de um bichinho de estimação. A dona do bichinho queria escrever, em Quenya, as palavras “Eu pertenço a Ranaewen”, mas não conseguia achar em qualquer “dicionário” uma palavra para “posse”. Sua tentativa mais próxima foi **amin nauta an Ranaewen (desnecessário dizer que a tradução é do élfico da Grey Company, que não é tolkieniano).
Como nós sabemos que Tolkien deixou explícito que os elfos não “tinham filhos”, mas “estavam com filhos” — ou seja, não se referem aos filhos como posses — Annaka (usando o nome Órerámar) aparentemente estendeu a cortesia élfica, com a ajuda de algumas frases tiradas do “Book of Lost Tales”, a todos os seres vivos. As mensagens que originaram as discussões estão aqui e aqui, e a lista de mensagens que as seguem podem ser vistas após as originais.
Mas meu objetivo não é acabar com a reputação da pobre Annaka — todos nós cometemos gafes, e minha primeira mensagem na Elfling não foi diferente. O objetivo é lembrar que quando vamos fazer uma construção em neo-élfico, é importante sim imaginar como um elfo falaria, pois as línguas élficas não são apenas o português ou o inglês disfarçados. Mas para isso é importante estudarmos sem preconceitos as obras de Tolkien, relermos passagens e reavaliarmos nossas interpretações. A Annaka, por algum motivo, não só não viu o óbvio como se recusou a aceitar uma quantidade convincente de provas contrárias ao seu ponto de vista. Não façamos o mesmo erro em nossas traduções.
O caso possessivo indica a posse de uma coisa por um indivíduo (ex.: Róma Oroméva “Trompa de Oromë”). Ele também pode indicar o que caracteriza algo ou alguém (ex.: Taurë Huinéva “Floresta da Obscuridade”; o adjetivo huinë caracteriza taurë).
O caso é formado ao adicionar-se a desinência -va em palavras que terminam em vogais e -wa naquelas que terminam em consoantes. No plural, utiliza-se -iva.
Digno de nota é: “Se a desinência -va for adicionada a um substantivo de pelo menos três sílabas que termine em uma vogal, e as duas últimas sílabas forem curtas, então a vogal final é alongada antes da desinência casual ser adicionada, de modo que ela atrai a ênfase: a forma possessiva de Oromë é portanto Oroméva (e não **Oromeva). Por alguma razão, tal alongamento também ocorrerá se o ditongo ui ocorrer na penúltima sílaba do substantivo; a forma possessiva de huinë ‘obscuridade, sombra profunda’ é, assim, huinéva.” (Curso de Quenya, p. 212)
Substantivos Verbais ou Abstratos
Substantivos verbais, como o nome diz, são aqueles derivados de verbos. Eles podem ser formados adicionando-se as desinências -më, -lë, -ië e -ë ao verbo desejado. Um exemplo é linda- “cantar” + -lë formando o subst. lindalë “canto, música”.
Muito importante! Os casos genitivo e possessivo interagem com substantivos abstratos desta forma:
Combinando um substantivo verbal com um substantivo no caso genitivo, o substantivo com o caso genitivo é o sujeito da frase. Ex.: Altariello nainië “Lamento de Altariel” (Altariel é quem faz o lamento).
Ao fazer agora a combinação de um substantivo verbal com um substantivo no caso possessivo, o substantivo com o caso possessivo é o objeto da frase. Ex.: Nurtalë Valinóreva “Ocultação de Valinor” (Valinor está sendo ocultada pelos Valar, e não o contrário, portanto ela é o objeto).